Todo mundo carrega algum tipo de estigma nessa vida. Ninguém tem ou teve uma vida cem por cento maravilhosa sem nenhum desafio ou problema. De todos os desafios que eu tive, o mais difícil é aquele que surge daquilo que me é mais precioso, daquilo que me dá trabalho, lazer, diversão e uma compreensão maior: minha mente.
Ela é uma força em constante atividade e movimento. Eu não consigo parar. São poucas atividades que fazem relaxar o turbilhão de ideias e sentimentos prontos para arrebentar tudo por onde passam. Se por um lado eu consigo tirar o melhor dessa força através do meu trabalho, consigo buscar diversão com a criatividade e imaginação que a esta energia me dá, por outro eu sofro com sua inquietude.
É como um balão enchendo. Se você não o esvaziar em algum momento, ele vai encher até estourar. É um rio furioso que eu represo para mover a minha usina de energia, para regar minhas plantações e as minhas flores de amor. Porém, caso eu pare de utilizar essa água, a represa simplesmente se rompe e destrói tudo por onde passa, inclusive eu mesmo.
Eu não consigo parar. Se tudo está quieto e eu não tenho nenhuma atividade para fazer, rapidamente minha mente se volta contra mim com pensamentos paranoicos e obsessivos, cada vez com um foco diferente. “Cabeça vazia, oficina do diabo”, diz o sábio ditado popular.
Se eu acordei com uma leve dor de garganta, em poucos minutos já imaginei um cenário catastrófico onde estou com COVID-19, transmiti para todas pessoas ao meu redor, vamos todos morrer ou ficar sequelados e diversas cenas tristes acontecem. Não, o racional de que eu apenas estou com uma leve dor de garganta porque dormi com a janela aberta ou não tomei água de madrugada é esmagado pelo turbilhão criativo-destrutivo de minha mente.
Entro em conflito com minha capacidade e a realidade, achando que eu devo e vou resolver todos os problemas do mundo que aparecem para mim. Se meu gato está com algum problema, não basta eu leva-lo à veterinária e seguir suas instruções. Eu preciso utilizar meu grande ego arrogante para revisitar tudo que eu fiz nos últimos meses e tentar entender onde eu falhei para que meu gato não estivesse com saúde 100%, mesmo que seja algum problema totalmente fora do meu controle.
Deus me deu algo tão bom, valioso e belo que minha arrogância faz acreditar que eu posso me equivaler a Ele, a Deus, compreender Sua mente e ter o Seu poder. Sinto Ele próximo de mim através deste presente incrível e que devo utilizar essa ferramenta plenamente.
Deus disse, através de minha terapeuta e de minha namorada: você precisa domar, controlar e canalizar toda essa força criativa para a escrita, que é algo que você gosta de fazer e pessoas gostam de ler. Você se sente bem fazendo isso. Por que não o faz?
Eu não sei. Eu acho que é uma forma de me autossabotar, de preguiça, de paranoia por achar que vou ser severamente julgado e punido se escrever e publicar o que penso. Acho que é parte da arrogância de achar que sou Deus e que, portanto, os outros que devem vir até mim e não eu ir até eles.
Conforme escrevo, conforme sinto meus dedos baterem sobre as teclas iluminadas de meu teclado colorido, sinto a água se acalmando, sinto um pouco mais de fluidez na mente, ouço menos ruídos. Talvez seja Deus me dizendo, de uma forma inteligente, na perfeição de Seu planejamento, para eu continuar. Colocou-me como adversário de mim mesmo, pois sabia que com minha tendência ao isolamento e à solidão eu não teria como fugir do dever de dar ao mundo aquilo que Ele quer que eu dê: a força da minha tempestade interior.
Eu não sei. Não preciso saber o que Deus quer e tampouco cometer o grave pecado de sentar em Seu trono. Talvez eu só deva viver ouvindo a leve chuva que cai sobre a represa, seguindo meu trabalho, meu lazer, minhas obras criativas, minha vida, com a confiança no plano de Deus. Ora bolas, se essa é a forma de enfrentar meu adversário mais difícil, não pode estar errado.