Muitos anos atrás, eu odiava quando me mandavam algum vídeo via MSN ou ICQ. Eu não ia parar de ouvir música para assistir nenhum vídeo. Foi naquela época que surgiu o YouTube. Demorei um pouco, mas não tanto, para começar a gostar do YouTube, embora até hoje eu te diga que não, não vou parar minha música para ver seu vídeo. Pare.
Acho que a coisa mais legal do YouTube era o fato de ver pessoas comuns falarem sobre assuntos aleatórios, como eram os blogs. Também ficou mais interessante ainda quando começaram a surgir canais de especialistas que eu jamais teria acesso. É muito melhor ver alguém que está em uma certa área de atuação falando sobre um tema que ela domina, mas da mesma forma que falaria em uma conversa informal, do que certos conteúdos muito superficiais e formais da grande mídia ou feitos para o grande público.
Você nunca verá o Kasparov falar sobre a mais bela partida de xadrez da história, contra o Topalov, em um programa de televisão, mas encontrará tal vídeo no YouTube.
Mas mais do que esclarecer curiosidades e ter acesso a temas de um nicho, o legal era ter acesso a conteúdos aleatórios de pessoas comuns agradáveis e espontâneas.
A espontaneidade que é algo tão em falta em um mundo onde estão todos preocupados com cancelamentos, politicamente correto, comentários, curtidas e aquilo que “os outros vão pensar na Internet”.
Talvez como um reflexo da sociedade, essa espontaneidade linda foi se perdendo no YouTube conforme “youtuber” foi virando profissão.
Durante um tempo, gravei alguns vídeos para a plataforma, com o intuito de ver como era e descobrir se havia algo que eu gostasse de fazer lá. Foi muito divertido e consegui aprender sobre mim e o tipo de conteúdo que eu gosto de produzir. O canal pode parecer abandonado, mas não está.
Bem, chega da divagação introdutória e vamos aos 10 itens que eu odeio nessa plataforma que eu adoro e consumo diariamente.
1.”Youtuber” ter virado profissão
Acabou com a espontaneidade. As pessoas não fazem mais vídeos porque querem contar algo interessante, desabafar, falar alguma besteira ou se divertir naturalmente. Antes era como se fosse uma conversa com amigos em uma mesa de bar. Hoje virou algo com “script”, artificial. Eu fiquei incomodado quando gravei alguns vídeos e falaram que eu era “youtuber”. Seria como eu ir jogar futebol nos fins de semana e falarem que eu era “jogador de futebol”, cozinhar arroz e falarem que eu virei “cozinheiro”. Era/é só um hobby totalmente informal. “Youtuber” é tua mãe. Ah, não, os vídeos dela estão no RedTube, não no YouTube. Desculpe.
2. Reclamações da desmonetização de vídeos
Acho isso esquisito para caralho. Você tem uma plataforma que não te cobra 1 centavo se quer, onde pode hospedar horas de vídeo em alta qualidade e reclama que ela não quer vincular anúncios no seu vídeo? Eu até entendo essa reclamação de pessoas que viraram “youtubers”, embora também ache que a plataforma não tem culpa se você decidiu usá-la como profissão e se, por algum motivo qualquer, os patrocinadores não queiram mais vincular seus anúncios nos seus vídeos. Mas é mais bizarro ainda vindo de gente que tem outras profissões e usa o “youtuber” como “renda extra” ou “hobby”. Se tu acha que teu conteúdo é tão fodão assim que merece patrocínio, vá procurar um patrocinador por conta própria que tenho certeza que deve haver muita gente interessada.
3. Choradeira do tipo “vídeo com assunto sério não dá view”
Ah, desculpe. Vou dedicar 2 horas do meu dia para assistir a todos os seus vídeos de “assuntos sérios e profundos”. Eu vejo todos os teus outros vídeos mas não quero ver tu falando de “assunto sério”. Que pessoa horrível que sou.
4. Click-bait
“Click-bait” são aquelas chamadas sensacionalistas nos títulos e miniaturas (thumbnails) dos vídeos para atrair clicks. Bem, não tem muito o que falar. Todo mundo odeia click-bait e todo mundo adora click-bait.
5. Vídeos de 15 minutos para explicar algo que poderia ser explicado em, literalmente, 20 segundos
A pessoa vive de YouTube, mas não tem mais ideia para conteúdo. O que fazer? Responder uma pergunta simples e que teria uma resposta de 20 segundos com um vídeo de 15 minutos contando toda história do Universo para só no fim dizer as três frases que respondem a pergunta original.
6. Introduções longas e vinhetas
Acho que virou padrão pular os primeiros 40-60 segundos de qualquer vídeo. Você tá se achando o Jornal Nacional com sua super vinheta. Desculpe, eu não ligo pra ela. Só dá um “oi” e começa a falar do assunto. E eu quase caí nessa de fazer vinheta…
7. Podcasts copiando podcasts
Eu gosto muito de alguns podcasts. Tem alguns episódios que realmente são excelentes, mas acho meio patético ter 985 podcasts entrevistando as mesmas pessoas e fazendo as mesmas perguntas. Você viu uma entrevista do Fulano, viu todas.
8. Downvote nos comentários
“Downvote” nos comentários não funcionam mais e não fazem nenhum sentido. Aliás, isso não é algo ruim: é algo ótimo. O botão de “downvote” nos comentários deveria ser removido.
As pessoas odeiam liberdade de expressão e, em geral, são ditadores enrustidos. Veja, uma coisa é eu ir no vídeo de alguém, comentar alguma coisa e o dono do vídeo excluir o comentário. Isso está certo, pois eu estou usando o espaço dele, a eventual fama, o trabalho dele, para promover algum pensamento que ele não quer promover. Assim como comentários em um blog. Censura seria eu impedir que você tivesse um blog ou o dono do vídeo impedir que você fizesse vídeos.
E qual a relação disso com o downvote? A relação é que em plataformas como o Reddit, se um comentário tem mais desaprovações do que aprovação, ele é oculto e o autor penalizado não podendo comentar mais por um certo tempo. Isso é simplesmente absurdo, pois desencoraja as vozes discordantes da maioria e as ideias novas, criando bolhas onde todo mundo diz e pensa a mesma coisa. Eu fico pasmo como ninguém se importa com isso no Reddit, mas é tema para outro texto.
9. Aquelas edições com milhares de cortes e zooms aleatórios
Cortes, quando bem feitos, passam quase que despercebidos – pois são naturais – e não causam problema nenhum. O que eu não consigo é ver aquelas típicas edições com cortes em toda respirada ou pausa de meio segundo em que o autor faz. Isso deveria ser crime.
Os “zooms” aleatórios são mais bizarros ainda: a pessoa vai falando e, em certas palavras, a edição faz um “zoom” na cara da pessoa. Para quê? Dar “dinamismo” na desgraça do vídeo?
Uma vez ou outra, para dar alguma dramaticidade, faz sentido, mas talvez você já tenha visto vídeos onde isso fica simplesmente insuportável.
Edições no YouTube, em geral, são muito ruins e desnecessárias. Talvez porque quem edite não saiba porra nenhuma, talvez porque quem faça os vídeos sejam pessoas comuns como eu e você, sem grande eloqüência e habilidades de apresentação. Mas, putz, não era esse o charme inicial do YouTube? Dar voz a todos? Cadê a espontaneidade e naturalidade?
10. Estratégias retardadas para “manipular” o algoritmo:
Ao invés de se referir à Twitch pelo seu nome, se referem como “o site roxo”, pois existe uma conspiração do YouTube para evitar que vídeos que citem o concorrente sejam indicados pelo algoritmo. Talvez isso exista, talvez não, mas se você vai fazer um vídeo como se estivesse no “Bem, Amigos”, onde não se pode nem falar o nome do time de futebol Red Bull Bragantino, vá catar coquinhos.
E aí o cara faz um vídeo falando de COVID, mas não cita “covid”, porque quer evitar a advertência do YouTube para procurar os órgãos de saúde oficiais para esclarecer dúvidas sobre a doença.
Não fala palavrão, não porque ele acha feio ou quer manter um vídeo mais amigável, mas sim porque quer evitar ser desmonetizado.
E a cereja do bolo: o cara oculta certas palavras no título ou na thumbnail, como “m3rd4”, “naz**mo” e outras tranqueiras. Foda-se. Pau no cu dos merdas de nazistas. Dói ser claro? O algoritmo que algoritmize a mãe dele.